Em fevereiro deste ano, duas secretarias do governo do Ceará anunciaram convênio para o compartilhamento de dados. A informação, surpreendente por revelar que pastas importantes para o desenvolvimento do Estado ainda não trocavam informações estratégicas, afirmava a finalidade da parceria: traçar planos conjuntos para o combate à sonegação fiscal. No lugar de investigações isoladas e ações difusas, as secretarias da Fazenda (Sefaz) e da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), auxiliadas pela inteligência artificial (IA), enfrentarão, juntas, criminosos especializados em evasão fiscal.
No dia em que o secretário André Costa, responsável pela SSPDS, assinou o convênio, a secretária Fernanda Pacobahyba apresentou ao companheiro de administração as instalações do Centro Integrado de Informações e Operações Fiscais (Ciof). Uma central inteligente de vídeomonitoramento que esquadrinhará a circulação de mercadorias nos 19 postos fiscais da Sefaz no Ceará.
”A troca de informações possibilitará uma ação coordenada para combater a sonegação e o crime organizado, irmãos gêmeos em uma sociedade complexa. Ainda mais quando se fala em uma construção compartilhada de sistemas de controle e acompanhamento”, definiu Fernanda Pacobahyba durante o ato de assinatura da parceria.
Há duas semanas, em entrevista ao O POVO, na divulgação dos resultados da Operação Aluminium, Fernanda Pacobahyba disse mais. Uma de suas metas, à frente da Sefaz, será refinar o que é produzido por um ecossistema tecnológico herdado de gestões anteriores. “Eu estou aqui para reconstruir a Sefaz. Temos um volume extraordinário de dados, mas o desafio é gerar informações qualificadas para nos anteciparmos ao crime ou interrompê-lo”, projetou a secretária.
Sefaz e SSPDS estariam fazendo a transição para os primeiros passos rumo ao uso mais consistente de inteligência artificial na lida com tributo e com segurança pública. Seriam as secretarias que mais mostraram interesse pelo desenvolvimento de IA para produzir resultados no dia a dia da máquina pública. É assim que enxerga Tarcísio Pequeno, presidente da Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (Funcap).
Ele diz que foi o próprio secretário André Costa que despertou para a necessidade de estratégias traçadas a partir da leitura de informações produzidas em quantidade, por exemplo, por uma Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança (Ciops) e o Sistema Policial Indicativo de Abordagem (Spia).
“Tecnologia pesada na SSPDS não é novo. Novo é um secretário ter a visão de ciência para combater o crime, de querer usar inteligência artificial para orientar estratégias. O outro secretário pedia mais homens, mais viaturas, mais armas, mais coletes. Costuma ser a mentalidade. A gente tinha tentado com outros secretários. Quem foi lá com os projetos e o custo, atrás do governador, foi o próprio André Costa”, reconhece Tarcísio Pequeno.
Em seu segundo mandato como governador do Ceará, o discurso de Camilo Santana (PT) em relação aos investimentos em pessoal, em logística e tecnologia na SSPDS nunca bateu com os resultados. Uma ladainha herdada do antecessor, Cid Gomes (PDT). Milhões empregados, principalmente em tecnologia da informação (TI), mas com os índices da violência urbana sempre crescentes.
A urgência de respostas mais eficientes para a segurança pública obrigou Camilo Santana a disponibilizar R$ 7,5 milhões. Recurso alocado na Funcap para o desenvolvimento de pesquisa científica na segurança pública em dois anos, de 2018 a 2019. “Foi uma combinação da necessidade flagrante do problema crucial para o Estado com a compreensão do secretário. Atualmente, é o maior projeto acompanhando pela Funcap”, explica Tarcísio Pequeno.
Pelo menos 50 cientistas da Universidade Federal do Ceará e mais servidores da SSPDS e da Polícia Rodoviária Federal estão trabalhando em soluções de inteligência artificial para a segurança pública. Segundo Tarcísio Pequeno, são estudos, por exemplo, para reconhecimento mais eficaz de imagens – tanto de veículos como de pessoas. Ou sistematização de padrões que permitam buscas mais rápidas e abordagens mais assertivas de criminosos e suspeitos.
O presidente da Funcap prevê que, num futuro próximo e com a integração de tecnologias e dados de vários órgãos, o Estado terá o Big Data Ceará. Um arquivo gigantesco de dados conectados. “Vai-se poder estabelecer uma gama de conexões que o ser humano não enxerga e a máquina não deixa passar. Começaremos a identificar, por exemplo, alguns “clusters” (grupos) e as correlações deles com pessoas e padrões”, projeta Tarcísio Pequeno.
A SSPDS, por uma necessidade gritante, partiu na frente juntamente com a Sefaz em relação a outras áreas do governo cearense. Na Secretaria de Planejamento e Gestão (Seplag) em parceria com o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará, de acordo com Tarcísio Pequeno, está sendo gestado o Big Data Ceará. Uma nuvem onde estarão hospedados dados produzidos por todos os órgãos da administração pública estadual. “Ferramenta que possibilitará o cruzamento de informações estratégicas para qualquer governo”, prospecta.